sábado, 26 de setembro de 2020

Algumas impressões sobre A Silent Voice

 

Este é o melhor filme de animação japonesa que vi até hoje (vi durante o mês grátis de Netflix). O anterior, que passa para segundo melhor é o Toki Wo Kakeru Shoujo, que permanece um grande filme.

A Silent Voice é sobre bullying, comunicação e relacionamentos. Não relacionamentos amorosos, mas os vários tipos de relacionamentos possíveis de desenvolver no contexto da escola e da família. Comunicação, porque uma das personagens é surda-muda, e os restantes personagens nem por isso, pelo que o desafio da linguagem apresenta-se em todo o seu esplendor. Bullying, porque a miúda surda-muda é apoquentada por vários colegas de turma, de várias formas, com variados graus de conivência. 

Há qualquer coisa nos autores japoneses que os leva a contar estas histórias de adolescentes de forma muito intensa, e nem por isso exagerada. Tenho quase a certeza que temos mecanismos psicológicos para refazer as memórias da adolescência e assim conseguir alguma estabilidade na idade adulta. Mas aqueles japoneses parecem ter esse mecanismo inibido. De facto, uma pessoa chega a ficar com a ideia que explicar a adolescência de alguém é explicá-la no seu momentos mais decisivo. Do que se depreendo que refazer a nossa memória da adolescência é perder o acesso a uma das verdades mais fundamentais da nossa vida. De resto, a arte visual deste filme tem tudo o que animação japonesa tem de melhor. É belíssimo, e está no grupo restrito de filmes que aconselho mesmo a quem não liga a estas bonecadas.

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Suspensão de vencimentos


Não sei quanto ganha o Secretário de Estado da Educação João Costa. Sei que independentemente do seu desempenho, a remuneração será sempre a mesma. Mesmo que no pior caso o regresso às aulas em tempo de pandemia fosse caótico, receberia o mesmo. E dificilmente alguém o chumbará, por maior que seja o fracasso. Terá sempre a oportunidade de permanecer e, se tanto, sair pelo próprio pé. Isto no pior caso, porque em questões menores, possibilidades destas nem se colocam. Um Secretário de Estado tem liberdade de manobra para fazer mandatos completos absolutamente medíocres. 

Um aluno trabalha pelas notas, embora sejam notas diferentes das que o SEE agora aufere. São proporcionais ao desempenho, avaliadas com uma grande componente de provas objectivas. A escola é o momento e o lugar da vida de uma pessoa em que sucesso e fracasso são mais reais. Não há desculpas, não há favores. A forma como o SEE privou os alunos do seu vencimento de dois anos de trabalho numa intervenção administrativa unilateral sem dó nem piedade, por uma situação que nem sequer foram os alunos que criaram é dos actos com mais requintes de crueldade que vi na arena pública nos últimos tempos. Defecou e urinou em dois anos de trabalho de alunos apenas para castigar o seu pai e dar o exemplo a quem mais se atrever. 

Isto é sobremaneira estranho quando se conhece o apetite do PS por acabar com os chumbos pela via administrativa para alunos sem aproveitamento escolar. É um assunto que regressa à baila periodicamente. Neste caso, serve apenas para lembrar a máxima "quem se mete com o PS, leva". Curiosamente, sintetizando as duas idéias, talvez consigamos perceber um pouco melhor a forma como a esquerda política tradicionalmente encara a questão do bullying nas escolas: jamais com punições tão duras quanto as que estes dois alunos receberam. 

Igualmente justo será pensar que no seu percurso escolar, João Costa terá transitado de ano de outras maneiras que não pelo mérito, ou não seria capaz desta insensibilidade. Sabemos de vários precedentes de falsas licenciaturas e graus académicos no mundo partidário. Ao chumbar alunos com aproveitamento, João Costa terá alguma coisa a provar. 

Decente seria, dado o carácter exemplar e simbólico de que o SEE quer revestir este episódio, que se filmasse a entregar em pessoa o papel da reprovação aos alunos e lhes explicasse o que se passou, assim fosse homem para isso. Eu gravava na box.